segunda-feira, 20 de março de 2017

"MILAGRES E MILAGREIROS", EM TERRAS LUSAS


Inspirando-me numa frase de Jorge Sampaio, temos de acreditar que há mais vida para além da “coragem” de Carlos Costa e da declaração milagreira de Teodora Cardoso.
O governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, teima em não pedir ajuda, ou melhor, em não se demitir, apesar de estar perdido numa floresta densa, onde não entra um único raio de sol.
Para auxiliar a sua orientação, até lhe podia oferecer, sem amizade mas com apreço, uma bússola, mas não lhe vejo outra alternativa senão içar uma bandeira branca, “impelindo-o” a ter a seguinte reacção: “Rendo-me, povo português”.
No livro «Correcções», o americano Jonathan Franzen lança uma frase irónica que cai como uma luva, no homem natural da freguesia de Cesar: «Como o mundo parecia empenhado em torturar um homem virtuoso».
Em relação a Teodora, não a que foi esposa de Justiniano mas sim a presidente do Conselho das Finanças Públicas, meio país (só para ser poupado) estremeceu quando ouviu: «Até certo ponto, houve um milagre no défice». Oh, diabo!
Influenciada pelo facto de usar uns óculos tão ou mais irreverentes como os que usava a Irmã Lúcia, e sabendo que o Papa virá, em breve, ao Santuário de Fátima, Teodora Cardoso ergueu a sua Fé e anunciou que testemunhou um “milagre”, justificando, assim, um encontro com Sua Santidade. Já agora, se alguém souber de um quarto livre, em Fátima...
Mas nem tudo foi mau, porque o nosso Marcelo saiu a terreiro (um minuto e vinte e cinco segundos depois da declaração de Teodora) para nos “defender”.
E, já agora, “milagre” era se, uma vez que em 2015 foi candidata ao Prémio Nobel da Economia, o conseguisse vencer.
Enquanto a poeira não assenta, valha-nos o facto de o Tribunal da Relação de Lisboa ter mandado recolher o livro do arquitecto Saraiva. Obra essa tão profunda e magnânima como o último livro de Cavaco Silva, ou o livro «Nascemos para ser felizes», do cantor Emanuel. 
A verdade é que, nos últimos tempos, não é necessário sair de Portugal para assistir a caricatos episódios políticos que são tão próprios da América do Sul. Na falta do palhaço Tiririca...

Comentário na Rádio Alto Ave e jornal Geresão.

segunda-feira, 6 de março de 2017

COMO "DEITAR A JUSTIÇA AOS PORCOS"? PUTIN EXPLICA!

Apesar de ter muita vontade de abordar as primeiras medidas do mandato de Trump, opto por “tocar” num dos seus “amigos”. Isto porque há acasos que são mesmo marcantes.
No início do mês de Fevereiro, acabei de ler o livro «Ressurreição», do russo Tolstói, onde sobressai, nomeadamente, o sofrimento que um homem provocou a uma mulher, no século XIX, e passados poucos dias, fico aterrorizado ao ler uma notícia, no sítio do Diário de Notícias, com o título: «Putin assinou a lei. Violência doméstica já não é crime na Rússia».
Ora, no país onde cerca de 36 mil mulheres são agredidas, diariamente, pelos companheiros, e 26 mil crianças são espancadas, anualmente, pelos pais, aprova-se uma lei que descriminaliza alguns actos de violência doméstica. Poder-se-á dizer, tal como anotou Tolstói na referida obra, «deitaram a justiça aos porcos». 
Os defensores da nova lei sustentam que é uma maneira de proteger a tradição russa. Ah, pois! Claro que sim, meus senhores! Se bem que, para manter a tradição, a “fasquia esteja um pouco alta” visto que, no ano de 2010, um relatório das Nações Unidas aponta que cerca de 14 mil mulheres são assassinadas, todos os anos. E já nem abordo a violência psicológica, que parece ser inexistente para Putin e amigos.
A Rússia até pode voltar a ser uma potência económica mundial, mas este retrocesso civilizacional humilha e envergonha um país que valoriza tanto os direitos humanos como a Síria ou mesmo Angola. 
Depois disto, importa realçar as palavras do príncipe Nekhliúdov, na obra «Ressurreição»: «Quando se reconhece que há coisas mais importantes do que o humanismo (…), será sempre possível que cometamos crimes contra os seres humanos e não os consideremos culpados». 
É verdade que Portugal também tem um caminho a percorrer no combate à violência doméstica, mas, felizmente, nos últimos anos, a nossa realidade tem vindo a mudar, acima de tudo, desde que a violência doméstica se tornou um crime público. 
A nossa sociedade civil está mais sensibilizada para este tipo de violência, faltando, agora, educar os adolescentes e compreender, por vezes, a nossa justiça. Basta recordarmos que, no passado mês de Janeiro, o Tribunal da Relação de Évora determinou que, «Apertar o pescoço não é violência doméstica».
Sinto uma “espécie de náusea moral”, como referiu Tolstói na obra supracitada. Mas esta “náusea moral” ainda não terminou. Algumas horas antes de ler a tal notícia, no sítio do Diário de Notícias, deparei-me com uma frase atribuída a Manuel Maria Carrilho, que responde em tribunal por violência doméstica contra a ex-mulher, Bárbara Guimarães, e que é a seguinte: «Eu só bebia por amor à Bárbara e para diminuir a dose dela». Uma frase que tanto poderia figurar num romance de Tolstói, como num sketch do Gato Fedorento.

Comentário na Rádio Alto Ave, e jornais Geresão e Notícias de Vieira (09/02/2017).