Conversas com seis pessoas centenárias enriquecem a nossa vida.
São pessoas com história e sabedoria. Os seus momentos inesquecíveis são
enriquecedores e as expressões são contagiantes. Tudo isto merece ser elevado,
e chegar a todos.
Do Mosteiro a Ruivães, passando pela sede de concelho, Agra e
Salamonde, saltam histórias que marcaram famílias e abarcaram a vida das
próprias comunidades.
Recuar mais de 100 anos é um exercício exigente. A Gripe Espanhola
causou, possivelmente, um maior número de vítimas mortais, do que o conflito
militar mais mortal da história - a Segunda Guerra Mundial, e atingiu uma das
nossas comunidades: Agra. As pessoas ouviam, naquele tempo, o sino tocar e
comentavam: “Aí vai mais um”.
De imediato, agarravam-se à fé e faziam promessas. A Arminda
Fernandes (que nasceu a 23 de Novembro de 1920) lembra-se de lhe contarem que o
seu avô, José Francisco Fernandes, prometeu oferecer, à Nossa Senhora do Porto
de Ave, uma vaca se, na família, não falecesse ninguém infectado pela Gripe
Espanhola. Felizmente, as graças foram concedidas, e o animal lá partiu.
Por vezes, é fácil olhar para o passado, como acontece quando o
olhar embate na Feira da Ladra. Palpitam, imediatamente, episódios fervilhantes
da vida em Vieira do Minho.
O carrossel dava ritmo à Feira, relaxando aqueles que não chegavam
a conhecer os trabalhos realizados nos teares de Agra, quando eram todos
vendidos na Feira de S. Miguel, em Cabeceiras de Basto.
A vontade da população em participar na Feira é tão grande, que
proporciona truques engenhosos. Anotem este ocorrido em Agra: a Constança, a
Ana e o António (irmãos da Arminda) adiantaram uma hora o relógio de sala, que
ainda existe, mas já não dá horas, para o pai, Manuel Fernandes, sair de casa
mais cedo para Calvos (onde ia apanhar a “carreira” para Cabeceiras de Basto).
Mal o pai saiu, os irmãos foram a correr até Celeirô, e sempre conseguiram
apanhar a “carreira” que ia para Vieira do Minho, onde um transmontano já
estava a marcar pontos.
Falta realçar que, em grandiosos eventos, encontramos excepcionais animadores. Em
meados de 1940, a Feira teve um especial: Pistolas (morava em Caniçó, lugar da
freguesia de Salto, concelho de Montalegre). Animava a Feira, tocando
concertina e cantando, com os altifalantes a fazerem o resto do trabalho.
Se reflectir de maneira superficial, posso imaginar uma vida
perfeita, quando a Feira da Ladra casa com a corrida ao Ouro Negro.
Porém, nesse período, a vida em Vieira do Minho não foi um mar de
rosas, para muitos. Que o diga a pessoa que, neste momento, é a mais velha do
concelho: Maria de Jesus Ferreira (nascida a 17 de Janeiro de 1919). Morou em
Campos e a sua proximidade à aldeia das Minas da Borralha (pertencente à
freguesia de Salto), onde abundava um precioso minério - o volfrâmio,
impulsionou-a a registar as consequências da descoberta de uma riqueza:
oportunidades, mas, igualmente, invejas, ilusões e sofrimentos. Para Maria
Ferreira, são sofrimentos ao nível do “roubo” do milho de que foi alvo,
contudo, inferiores à dor de ver os filhos emigrar.
O século passado esteve manchado de conflitos. Maria Gomes (que
nasceu a 19 de Junho de 1920) sente uma enorme dor de ver o filho partir, para
a Guiné-Bissau, onde foi combater na Guerra Colonial. Aerogramas e mais
aerogramas. Um meio de comunicação, relativamente, eficaz que agarrou o sonho
de voltar a vê-lo. A dor só desapareceu, quando o filho tornou-se visível.
Foram tempos difíceis. No entanto, a felicidade não virava costas,
como anotou Maria Gomes: “Íamos descalços, para a escola, com o vestido
rotinho. Comíamos só pão e sopa, mas éramos muito felizes”.
Continuarei, num próximo artigo, com pinceladas enriquecedoras de
vivências de mais três centenários vieirenses.