E tudo começou em 1969.
Posso anotar vários factos
marcantes, nesse ano, como Neil Armstrong ter sido o primeiro homem a pisar a
Lua, ou ter sido lançado o álbum icónico “Abbey Road” da banda The Beatles, mas
vou focar-me numa ocorrência dentro de portas: dois senhores, um chamado
Marcello Caetano e outro Américo Tomás, aprovaram a criação do Gabinete do Novo
Aeroporto de Lisboa.
É verdade. Por incrível que
pareça, o debate sobre este assunto começou há mais de 50 anos. O Diário de
Notícias até noticiou, na época, que o aeroporto seria, com 90% de hipóteses,
em Rio Frio, e lá receberiam os “gigantes ‘Concorde’”.
Em 1969, já consideravam um
“importante problema nacional”.
Estamos em 2020. Rio Frio é
alvo de notícia, mas por causa de uma herdade. Os “Concorde” deixaram de voar.
Mais 11 homens conseguiram a proeza de pisar a Lua.
Ah! Em homenagem ao nosso fiel
amigo, anoto que a construção de um novo aeroporto, na região de Lisboa, ficou
em águas de bacalhau.
Uma grande obra pública para
começar, no nosso país, passa o cabo dos trabalhos. Os obstáculos surgem, em
todo o lado. Uma autêntica novela sem fim à vista. Enredos
intrincados. É oportuno: cresci a ver telenovelas latino-americanas. Quem não
se recorda da dobragem para português do Brasil? Enquanto frequentava o ensino
básico, almocei várias vezes na minha casa. Recordo a Feijoada à Transmontana
que a minha mãe confeccionava. Boa combinação: uma garfada de feijão vermelho,
chouriço de carne e couve-lombarda e assistia a uma cena da telenovela.
Vários se sentem como Lila, no
livro “A Amiga Genial” de Elena Ferrante, quando esteve, possivelmente,
“dominada pela urgência de se sentir encerrada numa visão compacta, sem
fissuras”.
Aconteceram momentos
marcantes, ao longo de tantos anos. O aeroporto já esteve para ficar em 17 locais diferentes.
Tantos estudos e anotações! Tempo perdido e dinheiro que voou entre Rio Frio,
Tires, Ota, Alcochete…
A
construção de um novo aeroporto é urgente! Voltar à estaca zero? Será uma
loucura. Os enormes custos que isso também traz. O turismo desespera. Já
aterram mais de 31 milhões de passageiros, anualmente, na Portela.
Há pouco tempo, a “troika”
varreu para debaixo do tapete a construção de um aeroporto, mas vai ser
agora: o Governo de António Costa optou pela solução Portela + Montijo, e a
Agência Portuguesa do Ambiente deu luz verde ao novo aeroporto no Montijo. Ou será que
não vai ser agora?
Existe
uma questão que fez soar, ultimamente, o alarme. Devem-se ter esquecido que a
inexistência do parecer favorável de todos os municípios afectados “constitui
fundamento para indeferimento”, e vemos autarcas que são contra o aeroporto no
Montijo e que sonham com Alcochete.
Sendo no Montijo, há menos custos e a construção é
mais rápida? Não vou fazer como o Mário Lino e embrulhar-me em frases tacanhas
com a palavra “jamais”. Acredito nos técnicos qualificados que
defendem Montijo como a melhor solução.
Chamo, novamente, Lila e
vejo-a estreitar os olhos, “como se reduzir os olhos a uma greta lhe permitisse
ver de forma mais concentrada”. Vou tentar fazê-lo.
Uma
postura arrogante é nefasta. Faz-me cócegas ver o poder central de nariz
empinado, perante o poder local, comunicando uma decisão sem acontecer,
previamente, um diálogo construtivo (sempre aberto à negociação), entre ambas
as partes.
O poder central tem de estar
próximo dos autarcas e ouvir a população. Não vou abordar o encerramento do Serviço de Atendimento Permanente (SAP) nocturno
dos Centros de Saúde; o encerramento de Tribunais e o encerramento de
Repartições de Finanças.
Não
sei se está a acontecer um comportamento arrogante, neste processo, só as
partes envolvidas o poderão dizer, o que sei é que não se pode querer alterar a
lei, quando não dá jeito.
Imperando o bom senso, o Governo e os municípios devem ser elos da mesma corrente, e
saber que projectos, de âmbito nacional, não podem ficar presos a caprichos.
Comentário na Rádio Alto Ave, no jornal Geresão e na Cidadania Vieirense (10/03/2020).