Vou
continuar a virar-me para o passado, a ouvir a pessoa idosa e a enriquecer a
minha vida.
Procuro
momentos marcantes da bela Elsa Maria Cruzinha da Silva, que nasceu no dia 1 de
Agosto de 1929.
Entro
na sua casa, com três rosas cor-de-rosa na mão esquerda e livro e caneta na mão
direita. Sou recebido com a amabilidade que sempre a acompanhou, e frisou, de
imediato, que nasceu na vila de Vieira do Minho, na Rua Luís de Camões.
Numa
infância feliz, onde o Jogo da Macaca e o Jogo de Saltar à Corda estavam
presentes, quando a Professora Virgínia não leccionava, é o partilhar de que
juntava moedas, ao longo do ano, para participar no Jogo do Ratinho da Sorte,
na Feira da Ladra, que mais a emociona.
O
silêncio, numa ditadura que amassava, não tirava ânimo à compra de uma rifa,
habilitando-se a ganhar brinquedos, louças, tapetes, entre outros.
Agora,
seguimos para a Serra da Cabreira com o seu pai, Artur da Silva Cruzinha. No
início da década de 1940, os lobos espreitavam e as trutas, que pesavam mais de
um quilo, serpenteavam no Rio Ave. De forma habilidosa, os peixes chegavam a
ser pescados com as mãos.
Artur
foi um mestre pedreiro de coração grande. O Estado, por vezes, demorava a pagar
e, quando isso acontecia, adiantava dinheiro do seu bolso, a alguns
trabalhadores que necessitavam. Uma coisa era certa: com dinheiro no bolso,
acontecia um bailarico.
A
destreza dos trabalhadores, e o apoio moral (e gastronómico) da sua esposa,
Glória de Jesus Gomes, e também da filha possibilitaram a construção,
nomeadamente, da Casa do Guarda Florestal de Agra. A sopa, que era cozinhada
num pote de ferro, com carne de porco, couve e feijão, dava energia e afastava
os invernos rigorosos que permitiam a construção de bonecos de neve, com cinco
metros de altura. E, com a passagem de tantas pessoas para as Minas da
Borralha, que foi chão que já deu uvas, estas comidas proporcionavam um
rendimento extra.
A
Elsa lembra-se bem de quando estavam em Agra: dormiam todos, de segunda-feira a
sábado, num salão da casa de Manuel Fernandes, onde uma lareira aquecia o
corpo.
No
que toca ao aconchego do coração, isso acontecia nas proximidades do Santuário
de Nossa Senhora da Orada, no Monte do Calvário, em Pinheiro, quando avistavam
a sede do concelho, no regresso a casa.
O
tempo avança e a costura entra na sua vida. Se é verdade que a costura surgiu
no Paleolítico, também é verdade que continua a ser transmitida, de geração em
geração: a Alice Pincães foi a mestra de costura de Elsa e o ensinamento
prosseguiu.
A
nossa protagonista, também conhecida como “Jéu”, dá um passo relevante, quando
começa a trabalhar numa loja de pronto-a-vestir, na vila de Vieira do Minho,
após recomendação de pessoas conhecedoras do seu trabalho, ao Moura, o
proprietário do estabelecimento comercial.
Os
vestidos de noiva da Elsa, com a elegância que um momento único merece,
começam, de imediato, a despertar a atenção e o desejo. Assim, surge um
acontecimento difícil de resolver: uma noiva quer um vestido igual a um outro
que viu, da autoria de Elsa. Com agulha, linha e tecidos, a vontade da noiva é
realizada e a amizade, com o meu tio António “Garrafa”, que trabalhava no
ateliê de alfaiataria, intensifica-se, ao longo dos anos.
O
casamento, no Santuário do Sameiro; o nascimento dos cinco filhos; onze netos e
seis bisnetos são momentos que transbordam amor, assim como quando viaja.
Um
país que a marcou foi a França, onde se deparou com contrastes: encantou-se com
o Santuário de Nossa Senhora de Lourdes, mas foi para o país de Victor Hugo que
o marido, Humberto Custódio da Silva, emigrou.
Não
adormece sem rezar o terço e acorda com vontade de cantar músicas sobre Vieira
do Minho, que aprendeu na escola, como a intitulada “A minha terra”:
Na
minha terra virada ao sol
Canta
de noite o rouxinol,
Canta
contente o passarinho
Que
alegra a gente perto do ninho.
Eis
Vieira terra querida de nós todos
Terra
bela no mundo sem igual,
Onde
o povo nos seus campos com amor
Canta
alegre a canção de Portugal.
(…)
Obrigado,
Elsa!
Opinião de Filipe de Oliveira na Rádio Alto Ave, n`O Jornal de Vieira e na Cidadania Vieirense (7/1/2021).