Passei o dia de
reflexão em Terras de Barroso, dando uma volta de bicicleta com o meu amigo Gil
Rocha. Enquanto subia uma estrada com inclinação de 11,3% (em direcção à
Carreira da Lebre, em Boticas), olhei para o guiador, depois para um
carvalho-português e pensei: Quem terá pedalada para, no dia de amanhã, reagir,
exemplarmente, aos resultados eleitorais?
Bem,
realizaram-se as eleições e o grande vencedor foi o Partido Socialista, que
saiu fortalecido. Não foi por maioria absoluta, mas também não foi por “poucochinho”.
O tema Tancos
não abalou António Costa. Nos debates, manteve-se firme, numa posição
defensiva, conseguindo resistir às investidas dos outros candidatos.
Costa festejou e
tem vários parceiros à escolha, para dançar o tango. Com um acordo global
(geringonça 2.0) ou negociação ano a ano, com maior ou menor jogo de cintura,
sabemos que se avistam negociações “amigáveis”.
No
centro-direita, aconteceu o que era previsível - uma enorme derrota. Rui Rio
tem que assumir, humildemente, a sua quota-parte de responsabilidade, no
resultado.
Tenho estranhado
ver o líder de um partido como o do PSD com pouca garra e ambição. Fiquei de
boca aberta com a reacção caricata à derrocada. Disse que, “não houve grande
derrota” e apontou baterias à Comunicação Social; sondagens. O facto é que, foi
um dos piores resultados da história do PSD.
Tudo isto leva
ao copo meio cheio ou meio vazio. Senão, vejamos com mais pormenor: é verdade
que a oposição interna nunca lhe deu paz, e o resultado não ficou na casa dos
20%, mas também é verdade que, na crise dos professores, a estratégia foi um
desastre; o “banho de ética” de Rio não atingiu José Silvano, o homem das
presenças-fantasma; avançou com julgamento em praça pública (quando critica
quem o faz) na questão de Tancos... e fico por aqui.
Ainda mais
incrível que saber que a Volkswagen vende
mais salsichas do que carros, foi olhar para quem esteve ao lado de Rio, na
noite eleitoral. Arrepiou-me ver Elina Fraga; Salvador Malheiro e Mónica
Quintela. Com estas companhias, os resultados dificilmente seriam brilhantes!
Em relação ao
CDS, aconteceu a hecatombe eleitoral. Assunção Cristas fez o que tinha de
fazer. Demitiu-se.
A líder do CDS
tinha a ambição de ser primeira-ministra, o que saudei porque provocou o habitual
conservadorismo nacional, no entanto, não resultou. Muita coisa correu mal e a
campanha, no Porto, foi o principal sinal do que estava para vir. Prejudicada,
seriamente, por ter pertencido ao Governo liderado por Passos Coelho, e com uma
postura, por vezes, arrogante, foi por pouco que não voltou ao “partido
do táxi”.
O Bloco
consolida-se como terceira força política e conseguiu um dos seus objectivos,
isto é, travar uma maioria absoluta do PS. Catarina Martins ainda esticou a
corda, por causa da paternidade da geringonça, mas não houve ganhos.
Com a
geringonça, o PCP derrapou e afundou. Começou nas autárquicas, depois europeias
e, agora, legislativas. Jerónimo de Sousa já deveria ter abandonado a
liderança. Está, claramente, sem energia e dinamismo para a exigência que o
cargo requer. Os comunistas perdem força na Europa. Até quando é que o PCP será
o que mais resiste?
O PAN sorri.
Colocou, verdadeiramente, no centro de debate a defesa do ambiente e dos
animais; elegeu quatro deputados e Heloísa Apolónia não foi eleita.
A realidade é
que, uma mensagem clara, que pensa na vida quotidiana das pessoas, é
extremamente eficaz. Os grandes partidos estão a perder esta capacidade e abrem
espaço ao surgimento de outras forças políticas. Ora atentemos no seguinte: os
partidos de menor dimensão conquistaram mais de 500 mil votos. E, entre os
pequenos partidos que conseguiram entrar na Assembleia da República, classifico
como interessantes os resultados da Iniciativa Liberal, que desejam menos
Estado, e do Livre, que será a “esquerda feminista radical”. São visões
políticas diferentes, que vão enriquecer o debate parlamentar, ao contrário do
Chega que só traz duas coisas - racismo e xenofobia.
Termino a
escrever no dia 9 de Outubro, e não consegui anotar algo sobre o Aliança. Olho
para Santana Lopes e penso no que escreveu o narrador Nathaniel, no livro “A Luz da Guerra”, do escritor Michael Ondaatje: “Tantos estilhaços sem
rótulo na minha memória”.
Comentário na Rádio Alto Ave e no jornal Geresão (9/10/2019).